“Melancholia”, ilustrações de Constança Araújo Amador no DINAMO10
Revolução de 360 graus. Tal como o mecanismo que o pai de Leo lhe oferece, um pedaço de arame contorcido que se adapta aos movimentos do novo planeta Melancholia, também o filme de Trier se apresenta, nos seus contornos gerais, como um engenho simples, mecânico e causal: a força gravitacional do planeta faz com que os papéis e forças das duas irmãs se invertam por completo. Tal como no caso de outros projectos desta colecção, também Constança Amador abdica dos pormenores da diegese para reconstruir os seus elementos na sua forma cabal, de silhueta, e imita a simplicidade dos mecanismos. Há em primeiro lugar a presença rítmica do planeta, que encarna literalmente a sua etimologia: “errante”. Esses círculos, manchas inconstantes e toscas de tinta que recuperam as mil e uma formas da história da ilustração científica (Hooke, Haeckel) e seus desvios (Tiago Manuel) parecem cumprir uma história solitariamente, sem a necessidade do melodrama humano, sem as paisagens à escala humana, sem as emoções que pouco importam às massas e às forças cósmicas. Então Amador contrapõe ao ritmo planetário a interrupção por dois conjuntos: por um lado, os rostos humanos, estrategicamente colocados no início e no fim, ora para dar o mote de uma observação protelada ora para mimar o embate dos planetas Melancholia e Terra; por outro, objectos fálicos, irrompendo da terra, erguendo-se, como se desejando contestar (mas jamais impedir) a forma do planeta – bandeiras de golfe, pinheiros, o gnómon, o teepee, a forma da noiva abandonando-se sexualmente no jardim. Se tensões existirem, são as de sempre, as do sexo e as da morte, apresentadas numa procissão de binómios inconstantes. A autora, ilustradora de nome alegórico, cria as suas imagens baseadas num “texto” de uma imensa solidez, sem ocultar o desejo de querer manter a fluidez e indeterminação das suas manchas. Daí que sobreviva muito espaço em branco, se alarguem as margens, se mantenham largamente as minúsculas ondas das aguadas e a mais pequenas ondas do papel por baixo, e nunca se ocultem os gestos de pulso e dedos que as orientaram. Não há busca por ilusões de representação, apagamento da presença do artista. A interpretação, a opção, a escolha, é claríssima. Voguem todas as formas num tique-taque insofismável, tudo é sempre apenas um prelúdio a um recomeço, ponto branco sobre preto, vazio pronto a ser preenchido de novo. Omnia mutantur, nihil interit. – DINAMO10 Rua do Trigo, 55. 4900-333 Viana do Castelo, Portugalseg – sex: 9:00 am – 12:30 pm, 2:00 pm – 7:00 pm | sáb: 9:00 am – 12:30 pm
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